A Física diz que toda ação provoca uma reação
inversamente proporcional. O Budismo de Nitiren Daishonin chama essa reação de “força
contrária”. A força contrária não é um elemento do mal, que tenha questões
pessoais em relação a nós, mas sim um elemento natural, assim como a inércia,
que faz com que a gente penda para trás quando o ônibus parte para a frente. Ela
faz parte do movimento. É impossível para qualquer criatura iniciar um
movimento sem deparar-se com a força contrária. Nada pessoal. Ela apenas
existe.
Como um elemento natural em nosso caminho, com o qual
temos de lidar, a força contrária tem muito a nos ensinar sobre nós mesmos. Deparamo-nos
com ela contrapondo-se justamente ao início de um movimento. E é no início que
podemos nos observar e decidir superar nossos limites ou não. A experiência de
subir as montanhas me deu um ótimo exemplo de como aproveitar a força contrária
a nosso favor, transformando-a em uma professora para o autoconhecimento e reveladora
de potenciais.
Quando saímos da inércia, da rotina, e colocamos nosso
corpo em movimento para buscar o topo de uma montanha, os primeiros 30 minutos
de caminhada são os piores. Nosso corpo não está acostumado a fazer aquela
força, a utilizar aquela quantidade de energia, nossas juntas estão duras,
nossa musculatura está mole, nossa circulação sanguínea está frouxa – nosso organismo
como um todo está condicionado ao mínimo esforço que fazemos no cotidiano e
leva mais ou menos 30 minutos para que ele aceite o fato de que vai ter que
fazer mais e melhor do que isso, pois hoje o estamos colocando em movimento,
num novo movimento que pede o máximo que ele possa dar. Então vem a dor, a
exaustão precoce, as câimbras, a falta de ar. Vem a vontade de parar, sentar e
dizer “não consigo”. Eis a força contrária contrapondo-se ao nosso movimento.
Neste momento nos conhecemos melhor.
Há quem realmente pare ali e diga “não consigo”,
acatando a força contrária e mantendo-se na zona de conforto para não superar
seus limites, para não fazer esforço, para não desbravar a si mesmo. E ainda
assim está desbravando a si mesmo, pois está travando contato com seu conformismo,
com sua preguiça, com seu autoboicote, mesmo que inconscientemente, mesmo que
encarando isso como uma limitação factual e não como uma limitação
auto-imposta. E a força contrária já está atuando como professora. Nesse caso,
ela não poderá tornar-se uma reveladora de potenciais, pois estamos cedendo a
ela ao invés de aceitá-la como um estágio do movimento, mas já cumpriu com
metade do seu poder de ensinar.
Mas há também quem esteja decidido a ir até o fim, e
ao sentir o impacto da força contrária, perceba que a única coisa necessária é
continuar, pois o corpo terá de ser capaz de acostumar-se àquele movimento,
afinal muitos outros corpos já subiram aquela mesma montanha até o topo e o
cansaço não os matou (porque cansaço não mata mesmo...). Nesse caso, o contato
com a preguiça, o conformismo e o autoboicote se dão em forma de consciência,
não de entrega. E a consciência traz o desejo da superação. E o desejo da
superação traz à tona a força que estava guardada dentro de nós, que nos
impulsiona a ir adiante, a continuar em movimento até que o corpo desperte, que
a dor passe, que a circulação se estabilize, que os pulmões se abram. E
descobrimos que isso realmente acontece ao mesmo tempo em que descobrimos que
todas as nossas crenças a respeito dos nossos limites eram apenas apego à zona
de conforto, porque podemos ir muito além, somos muito mais capazes do que
acreditávamos. E é aí que a força contrária revela nosso potencial adormecido.
Assim como na subida de uma montanha, na vida
cotidiana também encontramos a força contrária contrapondo-se a todos os tipos
de movimento que iniciamos, sejam físicos, intelectuais ou emocionais. Mas, ao
invés de ficarmos ofendidos com ela ou cedermos ao seu contato transformando-a numa
sentença de fracasso, podemos dar um outro tipo de atenção a ela, observando
aquilo que ela causa em nós, observando a nós mesmos diante dela, observando e
aprendendo. Sem que houvesse a ação da força contrária, qualquer coisa que
fazemos teria menos poder, pois poderia passar em branco a conscientização
sobre quem somos, como agimos, como pensamos, como encaramos a nós mesmos e à
vida. Que venha a força contrária, que possamos agradecer à sua presença em
nossa caminhada! Mas que saibamos, desde antes deste contato, que é preciso
atravessá-la para compreender a dádiva que ela é capaz de proporcionar.
Abençoados sejam!
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